Hoje completa 7 dias que o parente Ivan desencarnou. Ivan acreditava que todos os negros são parentes. Na sua concepção os laços de parentesco estariam enraizados na África. A concepção de Ivan era tão forte que ao desembarcar da aeronave em Durban, na África do Sul, por ocasião da Conferência Mundial contra o Racismo, repetiu o ato simbólico adotado pelo Papa João Paulo II, beijou o chão da Mão Afrárica. Isso não é pouca coisa.
Ivan foi um lutodor incansável pelos direitos das comunidades quilombolas, grande parte das pesquisas sobre esta temática tem a participação deste Parente. Acho que ninguém no Maranhão conhece tão bem as comunidades quilombolas do Maranhão como Ivan conhecia.
Hoje compartilho com os meus leitores o texto da Professora Silvane Magali, com quem trabalhei na Sociedade de Direitos Humanos. Eu e Magali trabalhávamos pioneiramente com as mulheres extrativistas do babaçu. Enquanto Ivan e outros companheiros atuavam no Projeto Vida de Negro, de onde saiu grande parte dos estudos e estratégias de regularização dos territórios quilombolas do Maranhão e do Brasil. Outros companheiros e companheiras atuavam lutando pelos direitos humanos dos trabalhadores/trabalhadoras rurais humilhados/as pelo latifúndio. A nossa luta sempre foi pelo direito à terra para os povos do campo.
Leia a seguir o texto da Professora Silvane Magali:
IVAN, O PARENTE GUERREIRO E SOLIDÁRIO
Chegamos
a aproximadamente uma semana sem a presença física do nosso companheiro, amigo,
irmão e parente quilombola, Ivan. São muitas as lembranças, as saudades... daquele
que com seu jeito simples, seu tom firme e aparentemente “zangado”, conclamava
a todos/as nós a lutarmos pelas conquistas e garantias de direitos do povo
negro.
Ivan
era coragem, persistência e dedicação a uma causa. Convicto de suas idéias, às
vezes (como é natural do SER HUMANO), resistia a “arredar pé” do que pensava,
mas isso não o tornava intolerante, pois, no seu jeito relutante, buscava
puxar-nos com carinho de companheiro para somarmos às suas idéias.
Ivan
era solidariedade. Preocupado com companheiros/as nas nossas “questões
coletivas e particulares”. No CCN, na SMDH, nas viagens do PVN e da ACONERUQ, e
em tantos outros espaços, convivi com um parente solidário, atento às nossas
fragilidades físicas, emocionais, políticas, financeiras etc. Sempre preocupado
para que nas viagens nos sentíssemos “bem”, para que nos encontros e reuniões,
as coisas “andassem”, para que os compromissos com os projetos fossem
efetivados. Era um líder no sentido
pleno da palavra. Iluminava e contagiava de entusiasmo as comunidades
quilombolas, sem perder a noção de quão séria era a luta. Alegre, brincalhão,
apesar da sua fisionomia às vezes, dizer o contrário.
Ivan
era o intelectual orgânico da sua classe, da sua raça/etnia, da sua gente. Aquele
que sem possuir formação acadêmica em sua completude, soube fazer uso dos
conhecimentos que lhe foram oportunizados para “LER O MUNDO DE FORMA CRÍTICA,
SE CONTRAPONDO ÀS IDEOLOGIAS RACISTAS, AO CAPITALISMO E ÀS EXCLUSÕES. E mais do
que ler o mundo, multiplicou conhecimentos, articulou pessoas, para lutar.
E é
na multiplicação da luta do parente que devemos lhe prestar homenagens. A luta
está posta no dia-a-dia: em cada jovem vítima da violência policial nas
periferias da cidade, na falta de atendimento médico digno ou mesmo na ausência
de qualquer atendimento médico e escolar à população negra e pobre desse
estado, na concentração de terras, na omissão dos direitos à titulação de
terras aos quilombolas, no desemprego ou subemprego no qual somos maioria, nas
várias formas de exploração sobre as mulheres negras, na intolerância
religiosa, enfim, são muitas as lutas, são muitos os desafios, e muita deverá
ser a nossa determinação e disponibilidade para lutar.
Sabemos
que Ivan será LUZ e ENERGIA e que dele emanará AXÉ para as nossas ações
cotidianas em prol de um mundo SEM RACISMO.
Da
parente Silvane Magali Vale Nascimento
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