10 de abril de 2010

Censo Agropecuário mostra a força da agricultura familiar

“Os dados por si falam”. Felizmente não é assim, quem fala são os seus construtores. Além disso, os dados não “dados”, eles são construídos. Dentre tantas finalidades, os dados norteiam as políticas públicas, as ações políticas de movimentos sociais e as próprias pesquisas.
Os dados servem para refletirmos sobre a vida social como um todo, mas serve também de referência para setores bem específicos, é o caso da agricultura familiar.
A publicação dos dados definitivos do Censo Agropecuário do IBGE 2006 animam os seguimentos que acreditam na agricultura familiar como um setor que deve receber investimentos estratégicos, tendo em vista o desenvolvimento sustentável do Brasil Rural. As estatísticas censitárias demonstram que as reivindicações do MSTTR e de outros movimentos sociais do campo estão no rumo certo. Assim como o governo federal também tem acertado, na medida em que aceita as reivindicações e as transformam em programas, projetos e políticas públicas.
Sempre que pensarmos em pesquisas temos que imediatamente procurar saber alguma coisa sobre a metodologia adotada para a construção dos dados, a fim de que tenhamos a consciência de que estamos lidando com informações norteadas por conceitos e categorias analíticas que nos ajudam a compreender e a analisar a realidade. Os conceitos que são verdadeiras chaves de leitura do real devem ser compreendidos dentro de determinados contextos. É caso da agricultura familiar no Censo Agropecuário 2006.
O que o Censo Agropecuário está chamando de Agricultura Familiar? Ou seja, quem são os agricultores e agricultoras familiares?
A delimitação do universo da agricultura familiar para averiguação de sua participação econômica e social no setor agropecuário brasileiro levou em consideração os critérios de classificação previstos na Lei 11.326 de 24 de julho de 2006, a chamada Lei da Agricultura Familiar, considerando: o tamanho do estabelecimento; origem da mão de obra; a renda e a direção do estabelecimento ou empreendimento:
• A área do estabelecimento ou empreendimento não pode exceder 4 módulos fiscais;
• A predominância da mão de obra utilizada nas atividades economicas desenvolvidas na unidade familiar deve ser oriunda da prória familia;
• A renda familiar também deve ser originada das atividades vinculadas ao próprio estabelecimento ou empreendimento familiar;
• O estabelecimento ou empreendimento deve ser dirigido pela própria família.
Por outro lado, a pesquisa censitária ainda utilizou como fonte as estatísticas construídas no âmbito do Projeto de Cooperação Técnica FAO/INCRA que deram origem ao trabalho “O Novo Retrato da Agricultura Familiar o Brasil Redescoberto”, publicado em 2000.
Alguns dados da agricultura familiar chamam atenção pela força da produção e grandeza das dificuldades enfrentadas historicamente. É bom ressaltar que a colocação da agricultura familiar, seja nos discursos ou nas práticas governamentais, é um fenômeno novo. Vejamos alguns dados:
84,4 % do total de estabelecimentos agropecuários podem ser classificados como estabelecimentos familiares, são 4.367.902 estabelecimentos. A antítese é o percentual da área por essa imensa quantidade de estabelecimentos, apenas 24,3% do total. Enquanto a agricultura não familiar com 807.587 estabelecimentos (15,6% dos estabelecimentos) domina 75,7% da área total.
No Maranhão, dos 287.037 estabelecimentos rurais, 262.089 são classificados pelo IBGE como estabelecimentos de agricultura familiar, e 24.948 classificados como não familiares. Assim, 91,31% dos estabelecimentos rurais do Estado são familiares, no entanto, ocupam 4.519.305 hectares, o que representa apenas 34,79% do total. Isso equivale a dizer que 8,69% dos estabelecimentos classificados como não familiares ocupam 65,21% das terras. Em relação ao país, o Maranhão possui 6% do total de estabelecimentos rurais familiares. E, em relação ao Nordeste 11% do total de estabelecimentos rurais familiares da região.
A agricultura familiar responde por 38% do Valor Bruto da Produção, o que representa R$ 54 bilhões, com apenas 24,3 % da área total dos estabelecimentos agropecuários. Enquanto a agricultura não familiar é produz o equivalente a R$ 89 bilhões (62% VBP) concentrando 75,7% da área total dos estabelecimentos agropecuários;
 74,4 % do pessoal ocupado na agropecuária encontra-se na agricultura familiar. Isso corresponde a 12.300.000 pessoas contra as 4.200.000 ocupadas na agricultura não familiar. “O número total de pessoas ocupadas na agricultura familiar em 2006 é mais de que duas vezes superior ao número de ocupações geradas pela construção civil” ( MDA, 2009, p. 5)
No Maranhão, a agricultura familiar permite ocupação para 86% do pessoal que trabalha na agropecuária, enquanto a agricultura não familiar ocupa apenas 14%. Os dados do censo evidenciam a alta capacidade da agricultura familiar em absorver mão-de-obra.
Ainda em relação à ocupação de mão-de-obra, o censo aponta que 48.510 estabelecimentos familiares declararam que desenvolvem atividades fora do seu próprio estabelecimento, principalmente atividades agropecuárias.
A Região Nordeste continua apresentando o maior número de estabelecimentos da agricultura familiar. Este região concentra 50% do total de estabelecimentos familiares do país, seguido da Região Sul: 19%; Região Sudeste 16%; Região Norte 10% e o Centro-oeste 5%.
A agricultura familiar tem a tarefa mais importante e vital do setor agropecuária, a produção de alimentos. Produz 80% da mandioca; 70% do feijão nosso de cada dia; 46% do milho; 38% do indispensável café; 34% do arroz; 21% do trigo. A agricultura familiar aparece também com significativa produção de soja, 16%.
Na produção alimentos de origem animal a agricultura família também mostra o seu vigor. É responsável pela produção de 58% do leite; 50% de aves; 59% de carne suína e 30% da carne bovina.
Na mesma direção dos dados nacionais, a agricultura familiar do Maranhão, mesmo condenada pelas autoridades governamentais a não ter o apoio necessário ao seu pleno desenvolvimento, ainda é responsável por grande para da produção de alimentos de origem vegetal e animal: 88,68% da produção de arroz; 74,5% do feijão preto; 84,6% do feijão caupi, fradinho e de feijão de corda; 86,5% da mandioca; 78,4% do milho; 55% do leite de vaca; 67,3% do leite de cabra; 65% de ovos; 86% dos suínos.
Houve também um aumento no número de estabelecimentos familiares, em 1996 contávamos com 4.139.000 agora contamos com 4.551.000. Porém, há uma diminuição na área total, em 1996 a agricultura familiar detinha 107,8 milhões de hectares, agora concentra 106,8 milhões de hectares.
A agricultura familiar gera uma renda bruta da ordem de R$ 677,00/hectare contra R$ 358,00 da agricultura não familiar. Além disso, quando se trata da ocupação da mão de obra a agricultura familiar demonstra ainda mais vigor e importância. Em cada 100 há a agricultura familiar consegue empregar mais de 15 pessoas, deixando a agricultura não familiar fica bem aquém, porque só consegue absorver aproximadamente 2 (duas) pessoas. Para ser mais fiel aos dados, 1,7 pessoa.
Dos 80,25 milhões de hectares da agricultura familiar, 45% eram destinados a pastagens, 28% com matas, florestas ou sistemas agroflorestais e 22% com lavouras.
Os dados censitários nos permitem avaliar que a através da agricultura familiar é possível pensar em políticas públicas capazes reverter o ciclo negativo de péssimas condições de vida de milhares de brasileiras e brasileiras. Permite-nos ainda constatar a importância da agricultura familiar para a economia brasileira, particularmente através de sua capacidade de geração de renda e postos de trabalho. Além de sua capacidade de produzir em consonância com leis e as necessidades de preservação ambiental.
Por fim, é necessário nos determos especificamente aos dados que representam a realidade da agricultura familiar maranhense para averiguarmos qual o dinamismo deste setor diante das mudanças ocorridas em âmbitos regionais e nacionais. De pronto, já dar para afirmar que já está no tempo dos planejadores locais abandonarem a idéia de que agricultura familiar só da conta de microprojetos, micropolíticas, micro-orçamentos, microassistencia técnica. Produzir alimentos não é brincadeira.

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